Vamos falar sobre o novo imposto sobre altas rendas no Brasil…
A partir de 2026, a tributação da pessoa física de alta renda no Brasil passa a ter uma nova lógica. A Lei nº 15.270, de 2025, cria o imposto de altas rendas, que é um novo limite mínimo dentro do próprio Imposto de Renda da Pessoa Física. Para a pessoa física, o ponto mais importante é entender que essa mudança introduz duas etapas de cálculo e uma nova forma de olhar a renda ao longo do ano.
Inclusive, a Receita criou ainda um Perguntas e Respostas que estará sendo sempre atualizado para ajudar o contribuinte: Perguntas e Respostas sobre Tributação de Altas Rendas. Utilizei o documento atualizado em 16/12/2025 para preparar esse material. Procurarei ir atualizando esse artigo conforme os desdobramentos forem ocorrendo.
Novo imposto sobre altas rendas: duas etapas de apuração, mensal e anual
O foco da Receita Federal não foi criar uma nova tabela progressiva de imposto de renda com alíquotas mais altas, mas garantir uma carga mínima efetiva. Ou seja, não importa apenas quanto a pessoa ganhou, mas quanto de imposto efetivamente pagou em relação ao total da renda.
Na prática, a Receita vai somar os rendimentos do ano e verificar quanto de Imposto de Renda foi pago, seja por retenções na fonte, carnê leão ou antecipações. Se esse imposto pago ficar abaixo do mínimo exigido pela nova regra, a diferença deverá ser recolhida na declaração de ajuste anual.
Portanto, as pessoas com renda elevada que recebem por meio de lucros e dividendos, que até então eram isentos, tendem a ser as mais impactadas.
O novo modelo funciona em dois momentos distintos, que se complementam. O primeiro acontece ao longo do ano, de forma mensal, exclusivamente sobre lucros e dividendos. O segundo acontece na declaração anual, quando a Receita Federal analisa a renda total do contribuinte e verifica se o imposto pago foi suficiente.
Essa estrutura é essencial para entender por que, em alguns casos, haverá imposto a complementar e, em outros, imposto a restituir. A tributação mensal não encerra a conta, ela apenas antecipa parte do imposto mínimo que será calculado no ajuste anual.
1. Imposto Mensal (antecipação)
A partir de janeiro de 2026, sempre que uma mesma empresa pagar a uma mesma pessoa física residente no Brasil mais de R$ 50 mil em lucros e dividendos no mesmo mês, haverá retenção de Imposto de Renda na fonte à alíquota de 10%. Essa retenção incide sobre o valor total pago no mês, e não apenas sobre o que exceder esse limite.
Caso haja mais de um pagamento no mesmo mês, os valores devem ser somados e o imposto recalculado. Esse imposto é recolhido pela empresa e, a princípio, inclui as empresas do Simples, de acordo com o Perguntas e Respostas da Receita.
Um ponto fundamental é que esse imposto mensal sobre dividendos não é, necessariamente, definitivo. Ele funciona como uma antecipação do imposto mínimo que será calculado na declaração anual para quem tiver recebido acima de R$ 600 mil no ano-calendário (explico essa segunda parte do imposto no subitem abaixo).
Isso significa que a retenção dos 10% sobre os valores acima de R$ 50 mil pode ter destinos diferentes: ela pode ser totalmente utilizada no ajuste anual ou pode até ser devolvida ao contribuinte, na forma de restituição. Tudo depende da renda total do ano e da carga efetiva de imposto já paga.
2. Imposto mínimo anual
Na Declaração de Ajuste Anual de Imposto de Renda, o sistema da declaração soma os rendimentos recebidos pela pessoa física no ano calendário. Se essa soma não ultrapassar R$ 600 mil, o contribuinte não entra no regime de altas rendas. E, nesse caso, ele não tem nada mais a pagar e o imposto porventura retido mensalmente sobre lucros e dividendos passa a ser considerado como imposto pago a maior, ou seja, será restituído.
Além disso, mesmo lucros e dividendos que não tenham sofrido retenção na fonte entram no cálculo da renda total para fins de verificação da alta renda.
Se a renda anual ultrapassar R$ 600 mil, aplica-se a lógica da tributação mínima. A lei estabelece uma alíquota mínima que cresce de forma gradual entre R$ 600 mil e R$ 1,2 milhão e chega a 10% a partir desse valor. Essa alíquota incide sobre a base de cálculo definida na própria lei, que considera a renda global do contribuinte, com exceções específicas.
O ajuste na declaração de IR anual
Depois de calcular qual seria o imposto mínimo devido naquele ano, a Receita faz um verdadeiro encontro de contas. Ela compara o imposto mínimo com tudo o que já foi pago ao longo do ano.
Entram nessa soma o imposto apurado pela tabela progressiva na declaração, o imposto retido na fonte, inclusive sobre lucros e dividendos, o imposto pago de forma definitiva sobre investimentos financeiros e, quando aplicável, o imposto pago sobre rendimentos no exterior.
Se o total pago for inferior ao imposto mínimo, a diferença deverá ser recolhida na declaração. Se o total pago for superior, não há imposto adicional a pagar.
Quando há restituição do imposto sobre dividendos
Esse é um dos pontos que mais surpreende quem começa a estudar a nova regra. A retenção mensal de 10% sobre dividendos não significa, automaticamente, aumento de imposto.
Se a pessoa física sofreu retenção mensal sobre dividendos, mas sua renda total anual ficou abaixo de R$ 600 mil, ela não se enquadra no regime de altas rendas. Nesse caso, o imposto retido pode ser integralmente restituído na declaração.
Também pode haver restituição parcial dessa antecipação de imposto na distribuição dos lucros quando a renda anual ultrapassa R$ 600 mil, mas o imposto total pago como antecipação ao longo do ano superou o imposto mínimo exigido pela lei.
O que entra e o que não entra no cálculo da renda anual
Para saber se a pessoa física ultrapassou R$ 600 mil no ano e para calcular a base da tributação mínima, entram os rendimentos recebidos no ano-calendário. Essa é a grande mudança, a Receita passa a olhar a renda global do ano, com poucas deduções permitidas.
Na prática, isso faz com que salários, pró-labores, aluguéis, rendimentos financeiros e, principalmente, lucros e dividendos, distribuídos ou incorporados, componham a base de cálculo anual. O próprio material de perguntas e respostas da Receita reforça que, para o cálculo do rendimento anual, devem ser considerados tanto o valor total dos lucros e dividendos distribuídos quanto os incorporados.
Por outro lado, a lei também foi explícita ao definir o que deve ser retirado dessa base. São excluídos os ganhos de capital, exceto os ganhos decorrentes de operações em bolsa ou mercado de balcão organizado.
Também ficam de fora, os rendimentos recebidos acumuladamente tributados exclusivamente na fonte, quando o contribuinte não optou por levar ao ajuste anual, além de doações em adiantamento de legítima e heranças.
No campo dos investimentos, há a exclusão de rendimentos de poupança e a remuneração de diversos títulos isentos, como LCI, CRI, LIG, LCD, CRA, LCA CDA, WA, CDCA, CPR e as debêntures incentivadas, além de estruturas vinculadas a esses ativos. Rendimentos distribuídos por fundos imobiliários e Fiagro que atendam aos requisitos legais também não entram no cálculo.
Lucros e dividendos de 2025 ainda isentos
Um ponto relevante, destacado pela Receita Federal, é a regra de transição. Lucros apurados até 31 de dezembro de 2025 continuam isentos, desde que a distribuição tenha sido formalmente aprovada até essa data e que o pagamento siga o cronograma originalmente aprovado, podendo ocorrer até 2028. Sem essa aprovação formal até o fim de 2025, a isenção não se aplica.
OBS: Já saiu uma primeira liminar no Distrito Federal que garante a isenção do imposto mesmo que não tenha sido feita a apuração dos lucros e a aprovação dos dividendos até 31/12/2025.
O redutor para evitar uma tributação excessiva
Para evitar que a soma do imposto pago pela empresa e pelo sócio ultrapasse uma carga considerada excessiva, a lei criou um mecanismo de redutor. Esse redutor é aplicado no cálculo anual e limita a tributação total à soma das alíquotas nominais do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e da CSLL. Para a maior parte das empresas, esse teto é de 34%.
O redutor só entra em cena no ajuste anual e nunca na retenção mensal de 10 por cento sobre lucros e dividendos. Ele é aplicado quando, ao calcular o imposto mínimo devido pela pessoa física, a Receita Federal identifica que a soma da alíquota efetiva paga pela empresa sobre o lucro com a alíquota efetiva do imposto mínimo da pessoa física ultrapassa o teto definido em lei.
Novo imposto sobre altas rendas: o que muda na prática para a pessoa física
Mais do que uma nova regra, o novo imposto sobre altas rendas muda a forma de pensar o Imposto de Renda. A pessoa física deixa de olhar apenas para retenções isoladas e passa a precisar acompanhar a renda e os impostos pagos ao longo de todo o ano. Se a carga efetiva ficar abaixo do que a lei considera razoável para aquele nível de renda, a diferença é cobrada na declaração de ajuste anual. Isso muda o foco do planejamento.
O planejamento financeiro passa a ser anual, integrado e mais consciente. Entender essa lógica desde já é o melhor caminho para evitar surpresas e tomar decisões financeiras mais alinhadas com esse novo cenário.





