
Fui convidada pelo Broadcast, por meio da jornalista Karla Spotorno, para comentar um trecho da novela Vale Tudo que chamou a atenção de muita gente: Odete Roitman afirma que sua irmã Celina de 55 anos, está “falida”, mesmo tendo R$ 5 milhões na conta. O assunto gerou tanta repercussão que acabou sendo desdobrado por vários veículos, como IstoÉ Dinheiro, Uol Economia, Band, Folha de Curitiba e Brasil em Folhas.
Afinal, é possível estar falida com R$ 5 milhões? Falida, ainda não, pois ela possui esses recursos no banco, mas será que poderá falir em breve? A resposta é: depende! Isso vai depender do padrão de gastos, da expectativa de vida, do momento profissional (por exemplo, se ainda está na ativa ou se já aposentada), do perfil de risco que a pessoa possui (isso impacta na expectativa de rentabilidade dos seus investimentos) e, principalmente, do cuidado com os recursos.
As finanças da vida real e a novela Vale Tudo…
O que me chamou a atenção nessa história foi como ela expõe uma ilusão comum: a de que qualquer valor com mais de 6 dígitos já basta para garantir o amanhã. Mas a sensação de segurança pode ser traiçoeira quando não há clareza sobre quanto custa manter um estilo de vida, por quanto tempo esse patrimônio será necessário e quais riscos (principalmente em relação à saúde física e mental) ainda estão por vir.
Como planejadora financeira, já atendi pessoas que ganham muito bem e se sentem sempre no limite, e outras com renda mais modesta, mas que vivem com tranquilidade e propósito. A diferença está menos no quanto se ganha, e mais no que se faz com o que se tem.
As aparências…
Outro ponto importante é o aspecto psicológico da riqueza. A pressão de manter uma imagem, de sustentar hábitos caros ou de viver à altura de expectativas externas pode levar a decisões ruins. Não existe patrimônio que resista ao consumo desenfreado e à falta de autoconhecimento.
No caso da Celina, o problema pode não ser o valor dos recursos em si, mas sim a ausência de planejamento de longo prazo. Como ela não trabalha, se os gastos mensais ultrapassam os rendimentos reais dos investimentos, o dinheiro vai se esgotar em algum momento.
E isso se intensifica ainda mais pelo fato de o dinheiro dela ter sido uma herança que recebeu do marido. Quando a pessoa não produziu a riqueza, em geral, ela não tem a disciplina e a educação financeira necessárias para cuidar bem dos recursos. É como falei na entrevista: “Quem produz o dinheiro, geralmente, toma mais cuidado porque sabe o tempo e o esforço para ganhar aquele dinheiro. Sem educação financeira, o herdeiro se perde.”
Planejamento Financeiro e o exemplo da novela Vale Tudo
O caso fictício da Celina é, na verdade, muito real para muitas famílias. O que importa é ter clareza sobre os objetivos e limites, além de ter um plano. É ele que nos dá liberdade financeira, por meio da capacidade de enxergar o futuro financeiro, trazendo previsibilidade.
Pensando em tudo isso, fiz algumas simulações considerando uma inflação histórica média de 6% ao ano e imposto de renda de 15% sobre o rendimento dos investimentos.

O que os números mostram, sempre dependendo da rentabilidade estimada, é:
- Perpetuidade: resgata-se apenas os rendimentos acima da inflação (entre R$ 10.500 a 17.300/mês) e o patrimônio nunca se esgota.
- Horizonte de 40 anos: com retirada planejada de R$ 16.500 a 21.500/mês, o patrimônio se mantém por mais 40 anos até os 95 anos de Celina.
- Padrão alto de vida: gastos fixos de R$ 50.000/mês drenam o patrimônio em aproximadamente uma década, mesmo com bons investimentos e carteira diversificada.
Então, como a Celina não tem renda ativa e precisa viver exclusivamente desse patrimônio. Se ela mantiver um padrão de vida com gastos de R$ 50 mil por mês (o que não é incomum entre famílias de alto padrão), por exemplo, ela consumiria R$ 600 mil por ano. Em termos reais, ou seja, sem considerar a inflação e já descontando imposto de renda sobre a rentabilidade, o dinheiro acabaria em torno de 9 a 10 anos dependendo da rentabilidade dos seus investimentos.
Dessa forma, a Odete Roitman estaria correta, sim, ao afirmar que sua irmã estará quebrada em alguns anos! Afinal, é ela quem cuida das finanças da irmã e sabe exatamente quanto Celina gasta por mês.
No caso da Celina, a resposta para saber se ela está mesmo “falida” depende de um simples diagnóstico financeiro. E isso vale para todos nós: não é sobre quanto temos hoje, mas sobre como organizamos esse patrimônio para o futuro que queremos construir. Mas, como sua irmã Odete Roitman sabe quanto ela gasta, ela deve ter feito as contas para saber que faltará recursos para a irmã em breve!
Esse episódio da novela Vale Tudo foi um ótimo gancho para reforçar o que acredito profundamente: o planejamento financeiro não é sobre números. É sobre pessoas. Sobre escolhas. Sobre o futuro que queremos construir.
É por isso que sempre reforço: a sensação de ter muito dinheiro pode ser enganosa sem um bom planejamento. A falta de estratégia, de disciplina e de ajustes de rota ao longo do tempo pode fazer até grandes fortunas evaporarem.
Se você tem dúvidas sobre como transformar o que tem em uma fonte de segurança duradoura, o planejamento financeiro pode te ajudar e é justamente nisso que um planejador financeiro pode te auxiliar.